Eu
fazia oito anos. Ninguém é tão adulto quanto alguém com oito anos de
idade. As calças curtas, absurdas de inconsistência e incoerentes com a
minha pose, postura e alma adulta dos meus oito anos. Papai Noel é óbvio
que não existia! Eu não era nenhum bobo. Eu tinha oito anos. Até porque
ninguém sabia que eu morria de medo dos meus pais morrerem, de trovão e
do Junior, que era um cara que batia em todo mundo lá na minha turma.
Escondidos no meu coração de menino, os medos saltavam como bolas.
Mas
por fora, por fora eu era um homem. E se meus dentes de leite já haviam
caído e se o definitivo não havia nascido, eu não ria mais e pronto! Eu
já tinha oito anos. É por isso que eu achei bobeira aquele filme que
escolheram para a minha festa.
Aquele vagabundo de bigodinho,
bengala, era bobo. Se sujava na lama, tropeçava, tacava torta na cara de
todo mundo e quando sorria ... Ah, quando ele sorria me dava uma
vontade de chorar que eu odiava. Logo eu, um homem feito de oito anos,
chorando! Que raiva! Eu olhava aquele filme chateado, deprimido. Eu não
vou chorar. Na minha frente meu avô sério, careca, seco, e minha avó
triste. Sempre concentrados. Meus avós pareciam mordomos de filmes –
empertigados, sem emoção nunca. Nunca, não. Olhando aquele vagabundo de
bigodinho, chapéu coco e bengala, se dobravam de rir. Riam alto, de dar
vexame. E eu vi, pela primeira vez, eles se darem as mãos. E aí eu
chorei. Logo eu, um homem! Que ódio daquele vagabundo do filme! Ele me
mostrava, sem pena, que a ternura ia me acompanhar pra sempre nessa
miserável raça de adultos na qual eu julgava ter ingressado, nos meus
oito anos. As lágrimas escorreram, aí eu suguei com minha boca sem
dentes e ninguém viu. Graças a Deus, ninguém me viu chorar! Porque
todos, mas todos, morriam de rir, enquanto suas almas davam as mãos a
qualquer avó e a qualquer amor que ainda existisse.
Hoje meu
filho anda por aí comigo e pensa que eu sou artista. Ah filho! Como
aquele do bigodinho e da bengala, eu não sou não. Mas eu te juro: se o
teu filho puder vê-lo nos vídeos do futuro e olhar pra frente segurando
as lágrimas, vai me ver procurando a mão da avó dele. E ainda, morrendo
de rir.