No intuito de iniciar com ânimo e
alegria mais um ano letivo. Reuni algumas histórias
cômicas e às vezes até trágicas. Como professor,
passei por verdadeiras experiências socráticas das quais me faz recordar uma
frase de Sêneca “Ensinando, aprende-se.”. Mas, de todas as experiências, tem
uma que até os dias de hoje coloca-me a refletir e dar boas risadas.
Tudo aconteceu em uma sala de II
Jardim (Educação Infantil). Era quarta feira, resolvi visitar aquela turminha
que mal sabia escrever o nome. Todavia, não
escondiam a sua inteligência e desejo de aprender. Naquela manhã, iria contar
uma história como de costume. Não era professor daquela turma, porém, sempre passava por ali com uma fábula, uma novela filosófica e
um conto religioso.
A história escolhida para aquele
dia chamava-se “feijãozinho Pelado” uma adaptação pessoal de outra história “O
Feijão teimoso”. Dá um toque pessoal nas histórias já era uma prática normal: “O
Lobo mal que queria roubar as esfihas do ‘Habibs’ feitas pelo vovô levadas pela
Chapeuzinho; O Três porquinhos que se
escreviam no projeto ‘Minha casa minha vida’, O Pato Donald que se tornou
garoto propaganda do ‘Anapyon’ e o famoso Spctremam que passou a dar consultoria
aos heróis japoneses da HBO.” Posso lhes
dizer que em muitos casos passei o maior sufoco para conseguir um “final Feliz”
para aquelas histórias. Mas, nada foi mais cômico e trágico do que naquela
manhã.
A história do “Feijão teimoso” começa assim:
Certa vez, um velhinho de nome Expedito resolveu fazer uma deliciosa feijoada. Era sábado, dia
de feira. Ao chegar à feira comprou um quilo de feijão preto e os demais
ingredientes daquele que seria o manjar do final de semana. A história normal
segue com os um feijãozinho revolucionário que não deseja ir para panela e pula
no meio do caminho. Esconde-se e torna-se um lindo pé de feijão. Pronto este o
fim dá história, daí se coloca uma moral na história e todo mundo fica feliz.
Entretanto, estes finais terminam
como um ar de cansado. Ou seja, vou terminar aqui pronto. Em virtude do
costume, desejei fazer a minhas adaptações. Então, já que a história era de
feijão, por que não relacionar com a famosa história do “João e o pé de feijão”.
Após contar a primeira parte “O senhor Expedito e a compra dos feijões na feira”
iniciei as minhas adaptações.
O seu expedito voltava para casa com a lata de feijão todo feliz. Até
que aconteceu uma coisa que vocês não vão acreditar! Naquela lata de feijão havia um feijãozinho
que era primo dos feijões vendido para o João, aquela que derrubou o gigante. E
como ele sabia que era mágico, logo disse
aos outros que estavam com ele.
— Eu não vou virar feijoada de maneira alguma. O meu destino é crescer
e alcançar os céus. Não consigo ver-me misturado em uma panela cheia de gordura.
Fico todo escorregadio só de pensar.
— Mas, não tem jeito, meu amigo este será o nosso fim. E mesmo que pulasse
dessa lata, você não teria muita sorte como àquela “batatinha” que fugiu e
criaram um versinho para ela “batatinha quando nasce esparrama pelo chão...” Pois,
com o progresso as ruas estão todas asfaltadas e o máximo que lhe aconteceria seria
um moto-boy esmagar-te no asfalto.
Com as ponderações dos outros feijões o nosso amigo acalmo-se. Mas,
não desistiu do seu plano. Na primeira oportunidade sairia daquela enrascada.
Até aquele momento a história
estava sobre o meu controle. Todavia, tem sempre aquele momento em que as crianças encontram-se em uma agitação e o desejo de participar da história torna-se
incontrolável. Quando conhecem a história tentam contar junto contigo e quando não,
passam a fazer perguntas.
— Qual o nome deste feijão? Diz um curioso meio CDF.
— Ele tinha namorada? Diz uma apaixonada.
— Aminha avó sabe fazer feijoada.
Diz um gulosinho.
— Eu não gosto de feijão! Manifesta algum deveras mimado.
Cada uma das intervenções soa
como verdadeiras pérolas a serem aproveitadas a qualquer momento. Contudo, o
perigo mora nestes acréscimos. Quanto mais informações mais complexas tornam-se
as histórias.
Embora, não tenha sido este o
problema daquele dia. No ápice da história algo diferente aconteceria..
Então o feijão, naquele momento denominado Joca, organizava uma
revolução em toda lata.
— Vai ser assim. Quando o seu Expedito estiver a nos lavar para
colocar-nos na panela, iremos correr para o mesmo lado. Pois, com o peso apenas
de um lado a vasilha vai cair dentro da pia e vamos rapidamente escorrendo pela
encanação rumo à liberdade.
— Isso aí! Nós vamos mostrar o que somos capazes de fazer! Gritavam
todos os feijões dentro da lata.
A História já tinha dado liga e os
alunos já interagiam com a trama. Resolvi naquele momento inovar mais uma vez. Os
alunos representariam os feijões no momento em que se preparavam para saltar no ralo da pia. Mas, algo
terrível aconteceu naquele momento. Incorporados no papel de feijões, um grupo
de aproximadamente 15 aluninhos correram para um lado sala e juntos ao
professor gritavam.
“Vamos lá! Preparem-se para pular!!!
Estávamos todos ali envoltos no
clima da história, que aos poucos caminhava
para o seu final.
Quando de repente a professora
regente chega à porta da sala e fica a observar aquela balbúrdia e pensativa tentava imaginar. Onde tudo
aquilo iria acabar? Confesso, poucas vezes fiquei apreensivo com uma situação
em sala de aula. Mas naquele momento era protagonista do maior mico imaginado. O reflexivo professor filosofia havia se tornado
um caricato contador de história que fazia vozes, sons, caretas e tudo o que mais era possível em uma
história infantil.
Entretanto, junto ao mico sucedeu
um súbito branco “estoristico”, ou seja, não sabia em que parte da história me
encontrava e muito menos o que já havia
inventado até aquele momento. Após um
leva pausa saudei a professora
— Oi, tia! Acompanhado de um sorriso amarelo, um frio na barriga e uma
vontade de sumir.
Em qual parte da historia estava,
nunca mais vou lembrar-me. Contudo, arrumei rapidamente uma solução para aquele
problema.
Com um rápido movimento o senhor Expedito conseguiu impedir que os feijões fugissem assim a vasilha de voltou à
posição original.
Com esse adendo consegui voltar os alunos aos seus lugares. Faltava
agora conseguir terminar aquela história. Que aos poucos virava uma saga
pessoal.
Junto com uma garotinha que retornava do bebedouro, chegou uma idéia que me salvou a pele e impediu que os alunos ficassem sem o final da história.
Expedito tinha uma netinha que lhe veio visitar naquele sábado. Então
quando ela viu que o almoço seria feijoada
começou a gritar toda animada.
—Eu adoro feijoada! E correu para próximo da vasilha onde estavam os
feijões. Enquanto contemplava os feijões, o seu avô lhe perguntou.
—E você gosta de qual tipo de feijão? Preto, carioca ou fradinho?
Respondeu a menina toda pensativa
—Eu gosto de todo tipo de feijão, menos os peladinhos. Aqueles que
ficam sem casquinha...
Neste exato momento, o nosso feijãozinho
tratou de retirar sua casquinha e ficou peladinho. Rapidamente rolou bem para cima
da vasilha. De modo que fosse avistado pela menina. Que já se aproximava para
olhar dentro da vasilha. Joca estava sem roupas e provocou o maior alvoroço. Todos
gritavam.
—Retirem este feijão tarado daqui! Que falta de vergonha!
A menina sem notar aquela confusão, estendeu sua a mão retirando Joca
do meio dos outros que respiraram aliviados. "Ufá"!
—Vózinho! Eu não gosto destes
peladinhos assim. Joca estava entre os dedos da menina que o ameaçava jogar ele
fora.
O senhor Expedido consentindo
com o pedido de sua neta acenou a cabeça, mas, recomendou que o coloca-se no
quintal. Para que lá brotasse um lindo Pé de Feijão.
E assim fez a menina lançando sobre Joca um pouco de terra e após
tamanho esforço ele tornou-se um lindo pé de feijão e deu continuidade a
descendência dos feijões mágicos.
Já estava me esquecendo daquela
parte da moral da história. Ao qual inventei naquele momento e sai correndo.
Quem já viu aquele pé de feijão que nasce de modo misterioso perto da
pia da nossa casa ou lá no quintal? Pois é, eles são todos parentes do Joca.
Que por sua vez, são parentes dos Feijões Mágicos da História.Por isso eles
nascem com tanta facilidade em todos os lugares.
Ao terminar a história a
professora não sabia se sorria para mim ou de mim. Quanto àquela turminha? De
vez enquanto, encontro alguns jovens pelos corredores que já se preparam para o
vestibular e saúdam-me de modo não muito convencional para um professor de
filosofia.
—Ei, Tio! Aparece lá na sala pra contar aquela história do “Feijão Pelado”! Mas, Tio! só vale se tiver emoção!...
Ennis Araujo.