segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Como queria ter brincado!. Parte I


Este texto nasceu de uma crônica no período da faculdade de Jornalismo...

Véspera do dia das Crianças, nove da noite, alguém me pergunta: como foi sua infância? De que você brincava quando criança? Você sente saudades? De que modo você resumiria a sua infância? Fico pensando horas, e resolvo responder a partir da última pergunta.
Se fosse possível resumir o período de infância, escolheria a seguinte frase: “Imaginação dos possíveis”. O que provoca outra pergunta – “Por que imaginação dos possíveis?” Já que pensamos imaginação como tudo que acontece em meio a uma gama de coisas impossíveis de acontecer. Não adiantarei a resposta, mas deixe-me relatar um pouco da minha infância e assim, quem sabe, poderemos encontrar justificativas para esta definição.
Desde os anos mais tenros da minha vida, já estava a guiar os mais diversos e coloridos veículos que passaram pelas minhas mãos. Não sei quantos foram os caminhões de areia, de gado, de madeira e pedras que transportei. Sei que às vezes entregava terra vermelha no sul do Brasil e em poucos minutos, já estava a receber uma carga de pedras, logo ali nos Estados Unidos. Era só dar a volta em um grande monte de terra estacionado bem a frente de minha casa.
Vejo que não são diferentes as história das nossas infâncias com a historia da vida humana. Assim, como roda foi talvez um dos maiores inventos da humanidade. Foi graças às rodas que muitas brincadeiras foram possíveis. Voltando aos carros que tive ao longo da minha infância, é quase impossível imaginar de onde brotava tanto combustível. Alguns dos meus veículos eram movimentados de forma braçal a prova de sol, água, frio, e calor. Para que funcionassem, bastava uma superfície um pouco plana, em qualquer posição.
Traduzindo, algumas vezes qualquer canto de parede, sala, rua, mesa, telhado, porta de geladeira, era suficiente para construir uma cidade e gerar um engarrafamento que não se resolveria tão cedo. Estes carrinhos eram mais simples, feitos de plásticos, de madeira, de metal ou papel. Eram simples de serem manuseados, além do que eram os mais baratos.
Outro modo de conduzir os meus diversos veículos era por meio de barbante. Estes exigiam pistas um pouco melhores. As quais se tinham todo cuidado de preparar. Muitas das vezes havia mais diversão na construção das pistas do que na condução dos veículos. Recordo-me de uma pista feita de giz no asfalto. Na verdade, pista era pretexto para a construção de uma cidade.
Ali haviam postos de gasolina, padarias, casas, prefeituras, policiamento e até ladrão de veículos. Já dito, todos os carros conduzidos por um fio de barbante: de uma ponta o condutor, de outra o pequeno veículo, uma frota variada de pequenos caminhões a grandes fusquinhas. Digo grandes fusquinhas, porque me lembro de amigo que tinha um fusca amarelo maior do que muitos caminhões cegonha.
Posso dizer que foi por meio das rodas que passei a minha Infância. Ainda vi chegarem outros tipos de veículos com outros combustíveis como à pilha, fricção e a corda. Mas estes, dirigi muito pouco, primeiro pelos custos, depois pela fragilidade e por fim por que eram um tanto autônomos.
Algo importante da minha infância era a capacidade que tinha de trocar de profissão: acordava soldado e dormia piloto de avião. Durante o dia era professor, médico, jogador de futebol, padre, pai, veterinário, cantor, artista de cinema e principalmente cientista maluco. Ah. Esta era a profissão que mais gostava. Não podia ver um vidro de remédio ou uma caixa de comprimidos, que já queria criar uma fórmula milagrosa que resolvesse todos os problemas da humanidade.
Às vezes a fórmula para ficar invisível e invadir o supermercado ou entrar no banheiro das meninas. Em outros momentos, algo que fizesse crescer como um gigante bem forte e assim poder bater em todos, ou uma fórmula que ao apanhar da minha mãe não sentisse dores. Servia também uma fórmula que me deixasse tão pequeno que ninguém me encontraria. Nem com muito esforço conseguiria lembrar quantos grilos, besouros, borboletas e formigas foram mortas, na tentativa de criar um monstro que crescesse e obedecesse as minhas ordens destruíndo todas as pessoas que eu não gostava.
Na minha fase de “Da Vinci”, desmontei televisões, liquidificadores, rádios e ferros de passar, na tentativa de consertar e criar um aparelho que pudesse falar com extraterrestre. Também, tive a fase de jogador de futebol. Embora não seja flamenguista, queria ser como o Zico. Não durou muito essa fase. Pois, logo descobri que não tinha talento para tal coisa. Na verdade, não descobri; avisaram-me logo nos primeiros dias, embora tivesse insistido por alguns anos. O convite “vamos jogar bola parecia às vezes piada, por que de bola mesmo só me vem à mente um gordinho que ficava sempre no gol.
Explico, que na falta de bola, qualquer coisa que rolasse servia. Tinha de tudo: bola de papel, de meia, de plástico, caroço de abacate e caixas de papel. Caixas de Papel?! Sei que vão achar estranhos, mas, apesar de serem quadradas, eram as preferidas da gurizada. Quem, nãos e alegrou chutando uma caixa de papel pela rua?
O futebol era a brincadeira mais democrática da minha infância se jogava em quaisquer dois metros quadrados de largura e as nossas queridas Havaianas se tornavam desde traves e marcação de linhas laterais até outras mil utilidades. Vão me dizer que vocês nunca, usaram as suas famosas havaianas como luvas de goleiro enfiadas pelos dedos das mãos?
Lembrando de improvisos, quem nunca formou dois times um de camisa e outro sem? Sendo da geração anos oitenta, não poderia deixar de citar a queda do famoso Ki-chute para as coloridas chuteiras “Biribol”. E do surgimento da bola de couro e o declínio da bola “Dente de leite”. Esperada por muitos no dia das crianças.
Os anos oitenta possuíam uma característica singular: foi o período que podemos chamar de "avanço tecnológico dos brinquedos" invadiu o mundo infantil. Além dos carrinhos de controle remoto, bonecos e bonecas que acendiam luzes e falavam, não dá para esquecer dos famosos vídeo-games Atari e Super-Game, coisas reservada à classe média e tão aspirado pelas classes mais pobres.
Uma tela colorida com alguns barulhos nos envolvia em frente à televisão horas a fio. De um lado da casa, minha mãe dizendo “eu já ouvi falar que esta coisa estraga a televisão”. Não sei até hoje se é mito ou verdade. Mas, o que importa e que adultos viraram crianças em frente À tela e as crianças se portavam como adultos na disputa pela chance de jogar.
Quanto aos jogos, não eram muito diferentes um dos outros. Alguns quadradinhos azuis ora eram naves, ora eram carros. Um risco preto era possível ser desde uma bomba até a chave para próxima fase. Era enorme o esforço de imaginar que uma coisa em forma de losango era um carro de corrida, mas todos enxergavam, e aí de quem não enxergasse.
Talvez, tenha sido por isso que um jogo tosco de nome “River Raid” tenha se tornado a alegria dos viciados. Um jato bem definido percorria a tela de baixo para cima, destruindo navios e helicóptero, e às vezes tendo que abastecer. Mergulhavam todos em novo universo de imaginação e disputa.
Agora sim, Posso dizer por que defino a minha infância como “Imaginação dos possíveis”. Todos aqueles brinquedos eram reais e de algum modo me colocavam em contato direto com aquela realidade a imaginada. Tem uma musica do jardim da infância que é mais ou menos assim – Da abóbora faz melão/ do melão faz melancia/ da abóbora... Faz doce sinhá. Faz doce sinhá Maria...
Essa musica aponta que as relações imaginativas não vêm do nada, mas de uma serie de semelhanças. Gostaria que alguém convencesse uma criança que um cabo de vassoura é impossível de ser espingarda, cavalo, espada e violão. Com certeza será mais difícil o cabo de vassoura voltar a ser um simples cabo de vassoura do que a criança vê-lo como um instrumento mágico de mil utilidades.
Por isso, que ao me perguntarem “Do que você brincava quando criança?”Eu respondo prontamente “De nada”, pois estava muito ocupado a criar meus brinquedos e acho que não tive tempo de Brincar.

Ennis Aráujo. 



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